sábado, junho 03, 2006


Cansado, quando venho da minha cidade, passo sempre por aqui. E às vezes vejo papéis vagabundos que redomoinhando se embriagam pelo ar fora acendido junto à tarde que começa a cair. E pelos meus passos dentro há todo este algodão espalhado pelo caminho dolorosamente aberto depois do calor do dia. Desço do comboio. Atravesso blocos e blocos de prédios. E o chão é este orgão macio e suave, feito de uma matéria atenta ao sombrio e lento trabalho dos meus passos. Passo rua fora. E é este algodão melado e maduro que avassala toda a cega visão possível de um mundo que não seja esta luta inextíguivel entre ternuras na fulguração das massas. Tão macio. Tão suave, este algodão. E brilha e escurece. E cai a noite como a chuva aos grandes cachos por cima dele. E depois atravessa o sono e toda a terra, e todos os meus passos ainda lá estão. no segredo daquele segredo de tudo ser esta ternura sem tamanho. esta ternura de haver simplesmente o que há. esta ternura exasperada. da cor do algodão sujo pelo tempo. pelo pequeno bafo das nuvens, dos animais e das estrelas.